sexta-feira, 12 de outubro de 2007

Senado Imperial

* Queria que as cidades fossem grandiosas, arejadas, banhadas por águas claras, povoadas por seres humanos cujo corpo não tivesse sido deteriorado pelas marcas da miséria ou da servidão, nem pela vaidade de uma riqueza grosseira. Queria que as escolas fossem freqüentadas por jovens que não ignorassem jogos nem artes; que os pomares produzissem os mais belos frutos e os campos as mais abundantes colheitas. * Queria que a imensa majestade da paz romana se estendesse a todos, imperceptível, mas presente como a música do céu em marcha; que o mais humilde viajante pudesse passar de um país ou de um continente a outro, sem formalidades vexatórias e sem perigos, na certeza de encontrar em toda a parte um mínimo de legalidade e de cultura. * Não desprezo os homens. Se o fizesse, não teria o mínimo direito, nem a mínima razão para tentar governá-los. Eu os reconheço vãos, ignorantes, ávidos, inquietos, capazes de quase tudo para triunfarem, para se fazerem valer mesmo aos seus próprios olhos, ou, muito simplesmente, para evitarem o sofrimento. Sei muito bem: sou como eles, pelo menos momentaneamente, ou poderia ter sido. Esforço-me, portanto, para que minha atitude se afaste tanto da fria superioridade do filósofo quanto da arrogância de um César.
O homem mais tenebroso tem seus momentos iluminados: tal assassino toca corretamente a flauta; tal feitor, que dilacera a chicotadas o dorso dos escravos, é talvez um bom filho; um idiota partilharia comigo seu último pedaço de pão. Existem poucos a quem não se possa ensinar convenientemente alguma coisa. Nosso grande erro é tentar encontrar em cada um, em particular, as virtudes que ele não tem, negligenciando o cultivo daquelas que ele possui. Do livro " Memórias de Adriano" - Marguerite Yourcenar

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